Atualmente tem ocorrido cada vez mais a seguinte situação no meio corporativo: um colaborador desliga-se da empresa onde trabalha, passa a trabalhar em uma concorrente à sua ex-empregadora ou cria seu próprio negócio, passando a atuar no mesmo mercado da antiga empresa onde exercia suas funções. Até aqui, pode não haver problema, tendo em vista que o indivíduo provavelmente atuará em sua área de expertise, e considerando-se que não existia em seu contrato de trabalho cláusulas impeditivas, que criam uma proibição de atuação no mesmo nicho por determinado período, ou cláusulas de não concorrência, proibindo expressamente o colaborador de exercer suas atividades em empresas concorrentes.
Contudo, o problema se inicia a partir do momento em que o colaborador, ao assumir nova empreitada profissional, faz uso de informações privilegiadas às quais teve acesso em seu trabalho anterior ou viola expressamente cláusulas contratuais.
Nesse sentido, é muito comum o ex-funcionário ter acesso a banco de dados, cadastro de clientes e fornecedores, dados pessoais sensíveis, planos estratégicos de negócios, segredos comerciais e profissionais, bem como demais informações de alto know-how, por conta de suas funções ou do cargo de confiança que exercia previamente. Na rotina de trabalho, ao participar do desenvolvimento dos negócios ou ao ter acesso a este fluxo privilegiado de informações, muitas pessoas tem a falsa crença de que estas informações também lhe pertencem, o que é um engano, e acabam armazenando consigo todo esse histórico, levando para si próprio uma cópia desses dados, sem qualquer autorização. E assim, repassam isso para uma empresa concorrente ou utilizam na construção de seu próprio negócio autônomo.
Esse tipo de comportamento é muito grave, pode configurar alguns crimes, gerando responsabilidade para o indivíduo que o pratica e ocasionando danos (patrimoniais e de imagem) à empresa lesada.
Esses dados e informações portados indevidamente pelo ex-colaborador são de propriedade da empresa, fazem parte de seu core business e podem ser restritos.
Ao desligar-se de uma empresa e levar consigo informações privilegiadas ou ao repassar tais informações a um concorrente sem autorização, o ex-colaborador acaba incidindo numa prática que muitos chamam de “vazamento de informação”, que possui alguns desdobramentos jurídicos.
Quais são as implicações jurídicas relacionadas ao “vazamento de informação”?
O colaborador, no exercício de suas funções, ou após desligar-se da empresa, caso revele informações privilegiadas às quais teve acesso em razão de suas atividades, poderá estar incurso nas penas do crime de violação do segredo profissional, previsto no artigo 154 do Código Penal:
Revelar alguém, sem justa causa, segredo, de que tem ciência em razão de função, ministério, ofício ou profissão, e cuja revelação possa produzir dano a outrem:
Pena – detenção, de três meses a um ano, ou multa.
Isso acaba ocorrendo quando o indivíduo repassa à concorrente ou à terceiro informações sigilosas da empresa onde trabalhou, às quais teve acesso justamente em função das atividades que exercia. Muitas vezes, o ex-colaborador faz uso próprio dessas informações, ao utilizá-las indevidamente como base para a construção de seu próprio negócio. Desta forma, além deste crime, ele poderá ter praticado também o delito de concorrência desleal, definido no artigo 195 da Lei 9279/96:
Comete crime de concorrência desleal quem:
I – publica, por qualquer meio, falsa afirmação, em detrimento de concorrente, com o fim de obter vantagem;
II – presta ou divulga, acerca de concorrente, falsa informação, com o fim de obter vantagem;
III – emprega meio fraudulento, para desviar, em proveito próprio ou alheio, clientela de outrem;
IV – usa expressão ou sinal de propaganda alheios, ou os imita, de modo a criar confusão entre os produtos ou estabelecimentos;
V – usa, indevidamente, nome comercial, título de estabelecimento ou insígnia alheios ou vende, expõe ou oferece à venda ou tem em estoque produto com essas referências;
VI – substitui, pelo seu próprio nome ou razão social, em produto de outrem, o nome ou razão social deste, sem o seu consentimento;
VII – atribui-se, como meio de propaganda, recompensa ou distinção que não obteve;
VIII – vende ou expõe ou oferece à venda, em recipiente ou invólucro de outrem, produto adulterado ou falsificado, ou dele se utiliza para negociar com produto da mesma espécie, embora não adulterado ou falsificado, se o fato não constitui crime mais grave;
IX – dá ou promete dinheiro ou outra utilidade a empregado de concorrente, para que o empregado, faltando ao dever do emprego, lhe proporcione vantagem;
X – recebe dinheiro ou outra utilidade, ou aceita promessa de paga ou recompensa, para, faltando ao dever de empregado, proporcionar vantagem a concorrente do empregador;
XI – divulga, explora ou utiliza-se, sem autorização, de conhecimentos, informações ou dados confidenciais, utilizáveis na indústria, comércio ou prestação de serviços, excluídos aqueles que sejam de conhecimento público ou que sejam evidentes para um técnico no assunto, a que teve acesso mediante relação contratual ou empregatícia, mesmo após o término do contrato;
XII – divulga, explora ou utiliza-se, sem autorização, de conhecimentos ou informações a que se refere o inciso anterior, obtidos por meios ilícitos ou a que teve acesso mediante fraude; ou
XIII – vende, expõe ou oferece à venda produto, declarando ser objeto de patente depositada, ou concedida, ou de desenho industrial registrado, que não o seja, ou menciona-o, em anúncio ou papel comercial, como depositado ou patenteado, ou registrado, sem o ser;
XIV – divulga, explora ou utiliza-se, sem autorização, de resultados de testes ou outros dados não divulgados, cuja elaboração envolva esforço considerável e que tenham sido apresentados a entidades governamentais como condição para aprovar a comercialização de produtos.
Pena – detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, ou multa.
§ 1º Inclui-se nas hipóteses a que se referem os incisos XI e XII o empregador, sócio ou administrador da empresa, que incorrer nas tipificações estabelecidas nos mencionados dispositivos.
Caso o indivíduo repasse à terceiros conteúdo de documento ou de correspondência confidencial ao qual possuiu acesso, seja por questões pessoais ou profissionais, por conta de suas atividades (o que pode ser exemplificado no encaminhamento não autorizado de um e-mail – tendo em vista que e-mail pode ser considerado como correspondência – ou de um contrato restrito), essa pessoa poderá ter praticado o crime de divulgação de segredo, definido no artigo 153 do Código Penal: Divulgar alguém, sem justa causa, conteúdo de documento particular ou de correspondência confidencial, de que é destinatário ou detentor, e cuja divulgação possa produzir dano a outrem:
Pena – detenção, de um a seis meses, ou multa.